Olivia foi pra Lua é a história de uma menina que construiu um foguete para viajar até a lua. E que voltou para a Terra assim que o ar rarefeito lunar deixou de ser interessante. Simples e descomplicado como a imaginação de uma criança, o enredo é um delicioso passeio pelos lampejos criativos e imediatistas da infância criado pelo cartunista, ilustrador e artista gráfico Galvão Bertazzi. O livro é o primeiro trabalho autoral infantil do artista e acaba de ser lançado em versão digital.
Galvão Bertazzi é conhecido pela crítica social, pela ironia cáustica e escatológica nas tirinhas Vida Besta, publicadas desde 1999. Em Olivia foi pra Lua, ele deixa de lado a verborragia para acolher a sutileza textual e desapegar-se de lições de moral ou contos de princesa e príncipe, tão comuns nos livros infantis. A obra começou a ser desenhada em 2018, quando a filha mais velha do ilustrador, Olivia, tinha dois anos.
— Eu era responsável por fazer ela dormir quase todas as noites. Eu adorava. A gente criava historinhas juntos. Embora tivesse apenas dois anos, a Olivia já tinha um repertório de palavras e conceitos. A brincadeira era deitar na cama, sem planos, e criar várias histórias, sem sentido mesmo, sem amarração. O propósito não era ter coerência ou cronologia. Ter sentido é coisa de adultos — conta Bertazzi.
Ele desenhou a história em uma semana, as 42 páginas, com todas as cores. O texto foi sendo lapidado ao longo do tempo, nos três anos em que ficou na gaveta. O projeto inicial era para ser impresso, mas nenhuma editora se interessou. O motivo, segundo o artista, porque não tinha uma moral, porque não ensinava nada.
—Meu objetivo era que fizesse mais sentido na cabeça de um a criança do que na de um adulto. Sempre fui contra mudar qualquer parte da história para mostrar ensinamento, onde o “bem vence o mal”, essas coisas. Essas urgências de querer ensinar e passar algo são mais nossas, dos adultos. As crianças querem brincar — diz o artista.
Imediatismo não é para adultos
Galvão Bertazzi é goiano radicado em Florianópolis. A experiência como pai de duas crianças lhe deu bagagem para entender, ou tentar, o imediatismo infantil, tão poeticamente evidente em Olivia foi pra Lua. Na história, a garota não espera que o pai troque o depois pelo agora para ajudá-la a construir o foguete. Ou que a mãe finalmente tenha tempo diante de tantos afazeres. Ela simplesmente monta a nave e vai. E curte a atmosfera lunar, a gravidade, a companhia da cadelinha Viola. Até que… cansa. Simples assim. “Já ouvi mamãe dizendo que eu enjoo rápido das coisas…”, ela admite. Assim como foi, voltou.
— Crianças mudam de ideia o tempo todo e muito rápido. Querer instituir uma coerência para o que eles querem é um papo muito teórico. Elas querem brincar. Quando cansam, querem fazer outra coisa — resume o artista.
Nesse sentido, o livro acaba propondo diferentes níveis de leitura. A própria personagem aponta a tendência dos adultos de quase sempre deixar as coisas para depois — não que ela, como criança, sofra com isso. Os conflitos do livro, nesse sentido, são relacionados aos adultos e às suas tarefas importantes.
Bertazzi já ilustrou muitos livros infantis ao longo da carreira, mas este é o primeiro autoral feito para crianças, dos desenhos ao texto. O lançamento durante o período de distanciamento social devido à pandemia do novo coronavírus acabou funcionando como forma de reverberar a obra entre adultos e crianças.
— Valeu a pena ter esperado para colocar na rua. Mesmo sem o retorno de editoras, sem grana. Eu sozinho fiz ter mais de 3 mil downloads. É como se tivesse 3 mil livros vendidos. Não é a mesma coisa, mas ao mesmo tempo é — comemora.
O livro está disponível para download gratuito aqui.